CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Maria Cristina Baeta Neves
Senac - Departamento Nacional
cbaeta@senac.br
(Texto original com imagens: clique aqui)
RESUMO
Do compromisso de responder a uma demanda por melhoria e modernização quanto ao uso das novas tecnologias da informação e comunicação na modalidade a distância no Sistema Senac, foi elaborado e testado o Curso de Especialização em Educação a Distância.
O desenvolvimento do curso se fundamentou em uma proposta cognitivista de aprendizagem e se apoiou em três pilares. O primeiro foi o material multimeios - CD-ROM com livro eletrônico, fitas de vídeo, CD áudio, livro de orientações, disquete - que abordou cinco temas: O Cenário Atual da EAD, As Tecnologias Educacionais, O Planejamento e a Avaliação na EAD, A Aprendizagem e a Tutoria, A Elaboração de Projetos em EAD. O segundo foi a tutoria que se estruturou em dois níveis de atuação: tutoria especializada e tutoria de orientação. O terceiro pilar foi a organização de recursos da web para dar conta da comunicação entre todos os envolvidos no processo.
PALAVRAS-CHAVE
1. A demanda
Ano sim, ano não são realizados Encontros Nacionais sobre EAD para que se avaliem ações, reorientem rumos e proponham novos produtos a serem realizados pelo e para o Sistema Senac. No Encontro Nacional de EAD de 1998, foi solicitado ao Centro Nacional de Educação a Distância - CEAD - que elaborasse um curso de especialização em EAD para ser oferecido aos técnicos do Sistema envolvidos com a modalidade: àquele momento era necessário se imprimir melhor qualidade aos serviços oferecidos pela EAD e desenvolver competências que capacitariam os técnicos da instituição para se apropriarem das novas tecnologias da informação e da comunicação. Uma vez capacitados, estes técnicos desempenhariam o papel de multiplicadores junto a outros profissionais em seus Departamentos Regionais. Era, pois, necessário que esses educadores se movessem com clareza na sua prática: era preciso que eles conhecessem as diferentes dimensões que caracterizam a essência da prática da modalidade educacional a distância, tornando-se mais seguros no seu próprio desempenho.
2. A forma
A coordenação do projeto coube à equipe do CEAD, sob a orientação de Izabel Miranda Garcia de Sousa, e contou com a participação efetiva da equipe do CEAD e de Beatriz Maria de Arruda Pinheiro.
Assim, durante os anos de 1999 e 2000, o curso foi planejado e o material multimeios foi elaborado. Estava criado o Curso de Especialização em Educação a Distância! Um curso com a proposta de ser um metacurso, em que o profissional de EAD, além de adquirir o conhecimento especializado, teria a oportunidade de lidar com várias tecnologias, muitas vezes pela primeira vez, vivenciando a experiência de ser um aluno de um curso a distância.
O curso se compôs de um livro eletrônico que abordou os grandes temas que constituíam cinco unidades de estudo - O Cenário Atual da EAD, A Tecnologia Educacional, O Planejamento e a Avaliação em EAD, A Aprendizagem e a Tutoria, A Elaboração de Projetos em EAD. Para a organização e criação desses conteúdos, contou-se com a participação das especialistas Juliane Corrêa, Alicia Bonamino, Marcia Leite, Victoria Brant Ribeiro, Maria Judith Sucupira da Costa Lins, Maria Cristina Baeta Neves, Antonia Maria Ribeiro, Claudia Landim. Essas autoras criaram o texto base de cada unidade de estudo e indicaram leituras complementares com o intuito de enriquecer e aprofundar os temas tratados.
Para cada unidade de estudo, também foi gravado um vídeo (cada um com a duração entre 20 e 45 minutos) contendo sempre depoimentos de educadores destacados na área - Fredric Litto, Carmen Castro Neves, Silveira Lobo, Léa Viveiros de Castro, Gaudêncio Frigotto, Mirian Struchiner, Juliane Corrêa, Alberto Tornaghi, Marcia Feldman, Regina Salles, Apparecida Mamede, Rubens Mello, Carlos Lucena, Hugo Fuchs, Cel. Paulo Gil.
Na ocasião do planejamento do curso, optou-se, para o contato inicial com o material, pelo recurso de um livreto impresso. Ali estavam registradas as orientações para instalação do CD-ROM, as "regras do jogo" quanto a prazos, formas de avaliação, de interação entre alunos, aluno-especialista, aluno-tutoria de orientação e vice-versa.
Também integrava o material um CD áudio contendo três programas selecionados dentro da série radiofônica Espaço Senac em que havia entrevistas com conteúdos que estavam em perfeita sintonia com o tema do curso.
Por último, fazia parte do material um disquete onde estava gravada a legislação específica sobre EAD. Optou-se pelo uso de um disquete porque à época o capítulo referente à EAD dentro da LDB estava sendo normatizado e, conseqüentemente, decretos e/ou portarias surgiriam antes do final da elaboração do material. Aliás, foi por esse motivo que este foi o último recurso a ser elaborado. Nesse único disquete também estava um questionário de avaliação do curso. Afinal, se a primeira turma de alunos constituía a turma piloto, era de suma importância se ter acesso às suas críticas (positivas e negativas) e sugestões de acréscimos/supressões: elas seriam um dos elementos que norteariam a elaboração da segunda versão tanto do material quanto dos procedimentos de comunicação e interação.
Uma vez apresentados todos os materiais que integravam o curso, surgem algumas perguntas. Por que um material multimeios? Quais as suas vantagens? A escolha por um material apoiado em diferentes meios foi intencional: a rapidez do acesso, a garantia de um bom nível de imagem (vídeos) e, por incrível que pareça, a redução de custos por parte do usuário, pois muitas das ligações via Internet são caras, já que várias ligações telefônicas são interurbanas, por exemplo. E uma outra justificativa, definitiva para a sua escolha, foi a de apresentar maiores chances de fixação e abordagem do conteúdo.
3. O conteúdo
De acordo com as necessidades da clientela e com o potencial do Senac em termos de elaboração de materiais didáticos, não seria o caso de se reproduzirem modelos já instituídos, nem de se abordarem conteúdos já do conhecimento da grande maioria dos profissionais que lidam com a EAD na instituição. Como viver um cotidiano de reconstrução do conhecimento que possibilitasse relações mais próximas e democráticas entre professores e alunos? Deveria ser possível estabelecer vínculos de troca, de confiança e de parceria a distância. Que conteúdos abordar? Como avaliá-los?
O curso, organizado em cinco unidades de estudo previu primeiro apresentar um panorama da EAD no Brasil e no mundo. Panorama esse em que a primeira unidade de estudo não se limitaria a citar as experiências atuais com a EAD, mas que também apresentaria uma reflexão sobre sua evolução, bem como sobre o que dita a atual LDB.
A segunda unidade abordaria as tecnologias, já que a EAD sempre é mediatizada por uma ou várias tecnologias. Mas, tecnologia é só o recurso? Ou seria também a forma de abordar conteúdos? Estava, então, determinado o assunto dessa unidade de estudo - a tecnologia educacional abordada em seu sentido mais amplo sem se descuidar do uso das novas tecnologias e da comunicação, dentro do contexto de uma EAD de qualidade.
O que há de característico no planejamento e na avaliação em cursos a distância? Há que se considerar a especificidade da modalidade a distância, isto é, o ritmo e a forma individuais de aprendizagem, a provável falta de autonomia dos alunos para gerir a própria aprendizagem. A terceira unidade de estudo deveria, portanto, tratar do planejamento e da avaliação na EAD.
Muito se fala de que a EAD pode desempregar professores. Ledo engano! Quem aprende aprende melhor quando está sob a orientação de alguém com, pelo menos, mais experiência e conhecimento. Não é a EAD que desemprega professores... A EAD muda, sim, o desempenho dos professores e, certamente, lhes exige novas competências. Era preciso que se pensasse, se ponderasse sobre que competências eles deveriam desenvolver, qual era esse novo papel, qual era a nova função desse novo professor, como e quais os motivos para se optar por uma determinada teoria da aprendizagem que fundamentará todo um trabalho educacional. Assim,
o tema da quarta unidade de estudo do curso recaiu sobre as teorias de aprendizagem e o papel e funções da tutoria.
A qualquer momento, é solicitado a um especialista em EAD que elabore um projeto. São empresas que pretendem implementar ou mesmo expandir suas atividades de capacitação de recursos humanos, por exemplo. Respondendo a uma demanda do Sistema, estava, portanto, definido o último grande tema a ser abordado: a quinta unidade de estudo se dedicaria à análise e à elaboração de projetos.
Quanto à avaliação dos alunos, pensou-se que ela deveria ir acontecendo formativamente. Antes de concluir e enviar a atividade final de cada unidade de estudo, os alunos individualmente ou em grupo (o grupo de alunos de cada Departamento Regional podia estudar e construir suas atividades em conjunto) apresentavam várias atividades intermediárias. Essas atividades intermediárias além de ajudarem a construção da atividade final, foram uma das oportunidades de os tutores perceberem os pontos críticos que poderiam estar dificultando a aprendizagem e, por conseqüência, procurar saná-los.
4. A interação
O desenvolvimento tecnológico acabou por anular o distanciamento espacial com que a EAD sempre conviveu e pelo qual foi alvo de críticas. E uma vez anulado esse distanciamento espacial, caberia à tutoria usar mecanismos e se abrir para uma aproximação real com os alunos. Já durante o planejamento do curso, sabia-se que a EAD, quando acomodada ao espaço virtual, poderia se tornar um lugar de destaque para a formação educacional exatamente por possibilitar uma das práticas mais flexíveis da educação.
O material, elaborado com qualidade técnica e estética, não garantia, por si só, o sucesso do curso. O que validaria a intenção do CEAD, mais do que a qualidade do material, seria a relação estabelecida com cada aluno e com o grupo como um todo. Era, então necessário garantir a conversa, o diálogo e a troca, ou seja, estabelecer uma teia de aprendizagens sobre a EAD.
Para dar conta de uma ação qualitativamente positiva da tutoria, usou-se o recurso de uma tutoria dupla, ou seja, um grupo de tutores se responsabilizaria pelo conteúdo, esclarecerndo dúvidas, aprofundando conteúdos, avaliando as atividades dos alunos. O outro grupo se responsabilizaria pela orientação da aprendizagem, averiguando o porquê de atrasos, de não-cumprimento de prazos, de problemas de aprendizagem e pessoais, incentivando ante a desmotivação, procurando, enfim, construir um desenho do perfil do aluno para melhor ajustar o direcionamento da aprendizagem.
Várias autoras das unidades de estudo mantiveram-se no processo, desempenhando posteriormente o papel de tutoras especialistas, acompanhando os alunos, iniciando e mantendo diálogos, dirimindo dúvidas, resolvendo questões sempre relativas ao conteúdo da unidade, por meio de telefone, fax ou e-mail.
Pela tutoria de orientação, ficaram responsáveis duas pessoas da equipe de coordenação, a fim de garantir a afetividade, a criação de vínculos e o acompanhamento do desenvolvimento da formação dos alunos, quer dizer, a supervisão de todo processo ensino-aprendizagem.
Além desses dois níveis de tutoria, foram agendados chats temáticos e outros, livres, em que os alunos poderiam conversar sobre qualquer assunto. Os chats temáticos eram sempre precedidos de fóruns de discussão que subsidiavam a discussão que aconteceria posteriormente, durante o chat. E foi aí que se percebeu a pouca (e às vezes nenhuma) intimidade com a cibercultura! Os alunos, com reserva, participavam dos fóruns e quando se apresentavam para a discussão no chat não tinham o devido conhecimento do assunto. Esse foi, certamente, um aspecto que dificultou o desenvolvimento da interatividade.
Para a comunicação entre alunos e tutores, para a indicação de novos títulos, impressos ou disponíveis na web, e de eventos foi criado um site dentro do site do Senac, um subsite. Nele estavam reservados os espaços para os chats e fóruns de discussão, os endereços de colegas e de sites interessantes, e a agenda da programação das atividades do curso.
5. O momento presencial
No meio do processo, aconteceu um único momento presencial em que compareceram todos os envolvidos no processo: alunos, especialistas, a equipe de coordenação, além de convidados. Foi uma atividade muito bem sucedida, mas sua avaliação recomendou que os resultados teriam sido mais efetivos para o curso como um todo, se esse momento presencial tivesse acontecido no início do processo, ou se tivesse havido a oportunidade de se realizarem outros momentos presenciais. Isso porque devido à pouca intimidade com a interação via Internet, a maior parte dos alunos se sentia ainda muito mais à vontade dialogando e expondo suas idéias em conversas ao vivo.
6. A continuidade
A demanda por melhoria da qualidade da modalidade EAD não se restringia ao público interno do Senac: havia um público externo que apresentava grande interesse em querer conhecer mais, em se aprofundar no conhecimento específico sobre a EAD. Assim, a continuidade do curso em sua segunda versão oferecida ao público externo. Vários Departamentos Regionais, para oferecerem o curso ao público externo, vêm procurando estabelecer parcerias com universidades para que, juntos, possam certificar os alunos.
Quanto ao material, a segunda versão do curso necessitou apenas de que fosse feita a sua atualização. Isso se deveu, principalmente, ao avanço do uso mais amplo da Internet durante o período de implantação da turma piloto. Além, é claro, da inclusão de novos textos complementares que foram publicados mais recentemente.
Como durante a implantação da turma piloto foi possível fazer uma teleconferência com quatro das autoras/tutoras, o vídeo correspondente hoje também integra o material do curso. É uma hora de conversa informal toda ela pontuada de posicionamentos que merecem ser observados e discutidos. Este vídeo tornou-se um excelente material para discussão em momento presencial.
Apesar de a turma piloto ter seguido uma seqüência linear na abordagem das unidades de estudo, pode-se, perfeitamente, seguir uma estrutura não-linear, modular. Mas há de se ter atenção para que a não linearidade não prejudique ou mesmo dificulte a interação, fundamental para uma aprendizagem mais efetiva.
Quanto à interação, conhece-se agora melhor os limites e as possibilidades tanto da Internet quanto das pessoas: sabe-se que, em muitas circunstâncias, deve-se ir adiante com mais cautela. Há de se cuidar para se organizarem chats para pequenos grupos, dinamizarem mais os fóruns de discussão já que o nível de familiaridade dos alunos com a tecnologia ainda é muito variável. O tutor responsável pela dinâmica da interação via web deve estar atento a essas diferenças, procurando criar situações que dêem a oportunidade de os alunos desenvolverem a capacidade de se comunicar através da Internet.
Havendo uma boa interatividade entre todos os atores envolvidos no processo, muito provavelmente, uma vez concluído o curso, eles, por já terem criado vínculos e por estar envolvidos no mesmo fazer profissional, sentir-se-ão inclinados a se manter em contato, criando uma rede em que, como protagonistas, prossigam com a discussão de temas e questões afins, dentro de uma construção coletiva do conhecimento.
7. A bibliografia
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia - Saberes Necessários à Prática Educativa. São Paulo: Paz e Terra, 9ª ed. 1998.
RAMAL, Andrea Cecilia. Educação na Cibercultura. Porto Alegre: Artes Médicas, 2002
SANCHO, Juana Maria. Para uma Tecnologia Educacional. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998
SERRES, Michel. Le Tiers-Instruit. Paris: Editions François Bourin, 1991