A Linguagem Emocional em Ambientes Telemáticos: Tecendo a Razão e a Emoção na formação de Professores

 

Adriana Rocha Bruno

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP

arbruno@ajato.com.br

 

Resumo

O trabalho aqui apresentado teve por objetivo desenvolver uma investigação, à luz da Linguagem Emocional, buscando desvelar de que forma os educadores tecem/articulam a razão e a emoção nos cursos de formação de professores em ambientes telemáticos.

Os cursos a distância em ambientes telemáticos ainda estão, em sua maioria, sendo desenvolvidos por meio da linguagem  escrita.

Pressupõe-se que a linguagem utilizada, bem como a emoção dos sujeitos da aprendizagem envolvidos nestes cursos, podem favorecer as relações e interações nestes ambientes, onde o tipo de Linguagem Emocional utilizada pode contribuir no processo de construção do conhecimento.

O conceito e reflexão acerca do uso da Linguagem Emocional nos Ambientes Telemáticos tem como propósito o imbricamento, a articulação entre a emoção e a razão, mediadas pela linguagem, suscitando assim o desenvolvimento de um outro olhar para os cursos de formação de educadores nesses ambientes de aprendizagem.

O uso de uma Linguagem Emocional afetuosa/amorosa, nos cursos de formação de educadores em ambientes telemáticos, pode ser considerado um diferencial significativo para a aprendizagem, por criar um espaço operacional mais favorável às inter-relações, à mediação pedagógica e ao desenvolvimento dos processos reflexivos, auxiliando a construção do conhecimento.

Palavras-Chaves: emoção, linguagem, ambientes telemáticos.

 

 

Neste trabalho pretendo apresentar as contribuições que a pesquisa desenvolvida pela PUCSP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), acerca da Linguagem Emocional em Ambientes Telemáticos traz para os cursos de formação de educadores por meio de ambientes telemáticos de aprendizagem.

A investigação teve como cenário o “Curso de Especialização em Desenvolvimento de Projetos Pedagógicos com o Uso das Novas Tecnologias” parceria entre a PUC-SP e o Proinfo (Programa Nacional de Informática na Educação), destinado à formação processual (e em serviço), de professores-multiplicadores, para a apropriação das novas tecnologias, pautada na construção do conhecimento e na articulação teoria-prática.

Participaram do curso alunos-professores de todas as regiões do Brasil e alguns professores da América Latina, ocorrido no período de agosto de 2000 a outubro de 2001, por meio do ambiente telemático Teleduc do NIED-Unicamp.

Foram analisadas três conferências realizadas com 35 alunos-professores deste curso pelo fórum de discussão, com duração de cinco a quinze dias cada uma. Os conferencistas eram Professores Doutores convidados  a desenvolverem conferências, sobre temas pertinentes a educação e aos objetivos presentes no Projeto do curso.

 

1. Considerações Iniciais

Estamos vivendo a  Era do Conhecimento. Para alguns, o momento atual é de transição entre a Era da Informação e o Conhecimento.  As transformações advindas deste processo já se apresentam em nosso cotidiano nos mais diversos segmentos da sociedade.

O fio condutor desse processo se faz pela comunicação, centrado no uso da linguagem como meio de interação.

A linguagem tem sido explorada nas mais diversas formas possíveis nesses ambientes: visuais, orais e escritas. Pessoas estão se encontrando e se reencontrando, fazendo uso desse veículo. São chats (bate-papos), correios eletrônicos, fóruns de discussão, enfim, ambientes devidamente concebidos para que os indivíduos se expressem, se comuniquem, num processo de interação recursiva.

Na educação tal veículo passa a fazer parte dos ambientes de aprendizagem. Uma das propostas inovadoras nesse sentido encontra-se na Educação a Distância por meio de ambientes telemáticos. Esse segmento está sendo incorporado aos cursos universitários nas mais diferentes áreas e também aos cursos de formação continuada destinados a educadores de todas as áreas do conhecimento, suscitando mudanças paradigmáticas em todos os envolvidos no processo.

Diversas abordagens para a aprendizagem nesses ambientes emergem desse contexto. Algumas delas como a Broadcasting e virtualização da sala de aula tradicional, segundo Valente (2001), não se caracterizam pela interação, cujo aspecto é devalorizado.

Valente (Ibid.) propõe uma abordagem denominada “estar junto virtual”, que “envolve múltiplas interações no sentido de acompanhar e assessorar constantemente o aprendiz para poder entender o que ele faz e, assim, propor desafios que o auxiliem a atribuir significado ao que está desenvolvendo. Estas interações criam meios para o aprendiz aplicar, transformar e buscar outras informações e, assim, construir novos conhecimentos.”

O olhar aqui proposto refere-se a esse tipo curso em ambientes telemáticos, que promovam a interação, onde a dialogicidade seja uma das principais fontes de construção, aproximando os seres relacionais, e portanto do tipo “estar junto virtual”.

A educação nos ambientes telemáticos deve se pautar na relação interativa entre os sujeitos envolvidos ( professores e alunos) para a construção do conhecimento, considerando os indivíduos em sua totalidade, e como seres relacionais em constante transformação.

O processo de “trans” formação do professor está relacionado à mudanças posturais.

Freire (1987), ao nos apontar a questão da não neutralidade da prática educativa, exigindo definição, decisão, ruptura, posição, por parte do professor, infere-nos a necessidade de mudanças posturais desse educador, e que possivelmente só se transformará a partir do desenvolvimento do pensamento crítico reflexivo desse profissional, articulando os aspectos emocionais com os racionais, como estamos propondo em nossos estudos.

Devemos entender que mudança de postura não envolve apenas o campo profissional, mas o ser por inteiro. Não mudamos nossa postura apenas no trabalho; a mudança envolve discussão mais complexa, por exemplo: nenhum educador consegue desenvolver projetos dentro de uma linha sócio-construtivista se não  estiver consumido por inteiro, e principalmente em sua vida pessoal, pelos preceitos nela contidos.

O repensar contínuo e coletivo frente a necessidade de mudanças no paradigma atual, provoca reflexões relevantes acerca de aspectos, como: a abertura ao novo e a tudo que ele proporciona; a percepção dos aprendizes enquanto sujeitos ativos em interação com o meio; a superação da intransponibilidade cultural, temporal, espacial, por meio da aproximação e interação com o outro; o tempo cognitivo, onde o chrónos e o kairós precisam ser vistos/compreendidos por outros olhares, ante a virtualidade; enfim, questões inumeráveis que se descortinam diante de nossos olhos e revelam a impossibilidade de continuarmos enxergando o mundo de hoje pelas lentes do antigo paradigma.

Essa proposta porém, não é um fator isolado na formação do professor, e nem tem a pretensão de transformar sozinha a educação ou o professor, mas é interessante notar que o uso dessas tecnologias nos ambientes de aprendizagem tem viabilizado a concretização de situações de igualdade e/ou aproximação cognitiva, entre os sujeitos construtores do conhecimento, professor e aluno, que muitas vezes apresentavam-se distantes na prática.

Um dos caminhos para esse cultivo está na formação continuada dos professores, mas as condições para isso envolvem fatores diversos, e dentre eles estão as ferramentas utilizadas para que esse educador  se transforme, e esse artigo propõe um olhar para a linguagem emocional.

 

2. A Linguagem Emocional: tecendo a razão e a emoção

Somos seres autopoiéticos1, ou seja, somos organismos complexos e possuimos mecanismos de auto-organização sistêmico-recursiva, onde por meio das relações interativas com o meio, com as circunstâncias que nos envolvem, modificamos nossas estruturas e, assim, nos transformamos, preservamos a nossa organização e a nossa identidade e mantemos a vida.

O estudo das emoções foi, por muito tempo, desprezado pela Ciência. Alguns estudiosos se dedicaram ao tema somente no final do século XIX e início do XX, mas nunca houve dedicação suficiente para que os estudos se aprofundassem ou continuassem.

A partir da década de 60 os estudos dedicados à emoção e sentimentos são retomados e passam a ter um maior aprofundamento depois da década de 80.

Desse modo, temos hoje um quadro bastante diversificado quanto ao estudo das emoções. A Neurociência, Neuroanatomia, a Biologia, a Psicologia: clínica, social, discursiva, e a Ciência Cognitiva, entre outras áreas, têm dedicado seus estudos à emoção.

Segundo Damásio (2000:74/75), emoções “...são conjuntos complexos de reações químicas e neurais, formando um padrão; todas as emoções têm algum papel regulador a desempenhar (...) estão ligadas à vida de um organismo (...) e seu papel é auxiliar o organismo a conservar a vida.”

É importante ressaltarmos a ênfase apresentada por muitos estudiosos no que se refere às emoções como foco de conservação da vida (para alguns estudiosos articulados à homeostasia), aspecto do organismo que deve funcionar harmoniosamente para auxiliar a sobrevivência do ser humano.

Para Maturana (2001:129) as emoções são “disposições corporais dinâmicas que especificam os domínios de ações nos quais os animais, em geral, e nós seres humanos em particular, operamos num instante.”

Essa dinâmica do emocional funciona como base para toda e qualquer ação humana, enfatizando aqui a linguagem e a razão, que independente do espaço operacional, se faz num espaço especificado por uma emoção.

Assim, podemos conceituar a emoção por: reações (respostas) do organismo diante de fatores decorrentes de mudanças internas ou externas, conscientes ou inconscientes apresentadas, considerando as múltiplas circunstâncias, como: fisiológicas, relacionais, pessoais, cognitivas, afetivas, sociais etc, em congruência com os aspectos ontogênicos e filogênicos da existência humana, que se caracterizam principalmente pela conservação da vida.

A emoção e os estados emocionais estão presentes na vida e no organismo de todos os seres humanos. Sua diferenciação e classificação se faz possível, basicamente, por meio da consciência que,  através da linguagem torna possível a compreensão, a decodificação, a nomeação das emoções produzidas e vividas pelo ser. Porém, a expressão consciente das emoções se apresenta em articulação com a cultura e a história do ser humano. Temos assim culturas que se expressam diferentemente de outras, por valorizarem a expressão de algumas emoções e de outras não. A partir disso, podemos entender que a expressão de uma emoção pode ser aprendida, mas não a emoção em si.

Damásio (2000:75) afirma que a expressão das emoções está ligada ao aprendizado e à cultura, mas chama-nos a atenção ao fato de que as emoções “...são processos determinados biologicamente, e dependem de mecanismos cerebrais estabelecidos de modo inato, assentados em uma longa história evolutiva”.

 

Encontramos em Bisquerra (2000) aditivos a esse respeito, pontuando a função das emoções como motivadora, adaptativa, informativa e social; ressaltando que a cultura e a sociedade regulam as expressões das emoções.

Para esse autor, algumas atitudes ou episódios emocionais vivenciados repetidas vezes podem desenvolver “atitudes cognitivas emocionais”, ou seja, situações consecutivas de tristeza em demasia podem desencadear um processo de depressão.

Acredito que o trabalho desenvolvido nos ambientes de aprendizagem, poderá auxiliar na identificação, valoração e expressão das emoções, porém, as emoções em si, como disposições biológicas, ocorrerão/fluirão no organismo.

Desse modo, podemos entender que há possibilidade de aprendermos a valorizar determinadas emoções em decorrência das situações e circunstâncias experenciadas. Tais vivências levam-nos a desejar repetir ou não, a manifestação de emoções específicas.

Maturana (1998:15) chama-nos a atenção para o fato de que “ao nos declararmos seres racionais vivemos uma cultura que desvaloriza as emoções, e não vemos o entrelaçamento cotidiano entre razão e emoção, que constitui o nosso viver humano, e não nos damos conta de que todo sistema racional tem um fundamento emocional.”

A linguagem se faz a partir de interações recorrentes entre o ser humano e o mundo. Essas interações estão consubstanciadas, impregnadas da história de cada elemento em interação. Desse modo, a linguagem se faz entre sujeitos, em conversação, considerando-se o aspecto ontogênico dos seres, permeados pela emoção.

Os diversos conceitos de linguagem apontam-nos a relação extremamente imbricada entre a expressão e a comunicação, onde “a expressão manifesta o eu, a comunicação é procura do tu, tendendo o eu e o tu a unir-se na unidade do nós.” ( Gusdorf, 1970:53)

Se nos utilizamos da linguagem (corporal, oral e escrita) para nos comunicarmos e nos expressarmos ao mundo, e do mesmo modo, lemos, sentimos, enxergamos e percebemos o mundo por meio da linguagem, esse processo consciente está impregnado de emoção, sendo essa, em diversas circunstâncias, a indutora de ações e reações expressas pela linguagem.

 “Para o surgimento da linguagem, então, precisa-se de uma história de encontros recorrentes entre organismos que possibilite a coordenação conjunta de ações do conviver cotidiano deles.” (Gonzáles, 1993:30)

Assim, podemos inferir a respeito da ligação entre razão, emoção e linguagem, onde  razão e emoção se utilizam da linguagem como veículo de expressão e de comunicação entre eu, o mundo e o outro; lembrando que esse outro pode se apresentar no diálogo consigo mesmo (interno), ou seja, com o outro eu, e todo esse processo está promovendo manifestações emocionais.

Temos presenciado, como educadores nos ambientes de aprendizagem, situações que refletem a dificuldade na inter-relação educador/educando. Ouvimos constantemente as manifestações de insatisfação, tanto por parte de educandos quanto de educadores, no que se refere ao desentendimento entre o que um e/ou outro expressa no seu linguajar nesse processo relacional.

Esse aspecto é de suma importância para a reflexão do que entendemos por linguagem emocional.

Maturana (1997:170) explicita que: “...a existência humana se realiza na linguagem e no racional partindo do emocional.”

Se o simples domínio e articulação de palavras e/ou da linguagem, sustentadas na racionalidade, fosse suficiente para nos fazermos entender, nos aproximar dos outros e ainda interagir com o mundo, poderíamos dizer que esses problemas não mais existiriam atualmente, uma vez que o uso de técnicas de apropriação e domínio da linguagem seriam facilmente manipuladas.

Porém, Maturana deixa claro na afirmação acima, a linguagem e o racional partem do emocional, e portanto envolvem outros aspectos que o simples “domínio de técnicas” para o “con-viver” pelo “con-versar” humanos.

Articular, entrelaçar, imbricar: linguagem, razão e emoção passa a ser, desse ponto de vista, o grande desafio; e propõe-se que essa tecitura se dê pelo que chamamos de Linguagem Emocional.

A Linguagem Emocional é compreendida como um meio, uma forma, um dispositivo, um sistema intencional de expressar e comunicar emoções, mediado/permeado/viabilizado pela linguagem (conversação), para a relação de encontro, de contato, entre os sujeitos aprendentes em processo contínuo de transformação.  Assim, a Linguagem Emocional reflete, sistematicamente, as múltiplas formas em que os seres humanos estabelecem relações, utilizando-se das diversas linguagens, considerando o fator emocional como importante desencadeador das transformações decorrentes deste processo.

As transformações propostas nos ambientes de aprendizagem geram mudanças nesse espaço operacional (ambientes de aprendizagem). Podemos então considerar que quando mudamos as emoções, ou quando induzimos determinadas emoções, transformamos o ambiente ou espaço operacional, e consequentemente interferimos e transformamos o processo reflexivo e as ações entre os sujeitos autopoiéticos.

Esses aspectos se desvelaram nas investigações desenvolvidas no “Curso de Especialização em Desenvolvimento de Projetos Pedagógicos com o Uso das Novas Tecnologias – PUC-SP/Proinfo”, onde o “tom” utilizado pelo mediador pedagógico (conferencista) no início e no processo de interação influencia o tipo de resposta do interlocutor.

O processo de indução de emoções pode ser desencadeado pelo uso atento e adequado de diferentes linguagens, e desse modo, não aprendemos a ter/sentir emoções, mas sim a expressá-las. Somos seres emocionais por natureza. Na educação, educadores e educandos expressam, no seu con-viver, suas emoções, espontaneamente, na maioria das situações vivenciadas nos ambientes de aprendizagem.

Encontramos em Wallon (1941/1994:124), nos estudos acerca da emoção e afetividade, uma característica importante das emoções, que esse autor denomina de contágio das emoções:

“Entre as atitudes emocionais dos sujeitos que se encontram no mesmo campo de percepção e de ação, institui-se muito primitivamente uma espécie de consonância, de acordo ou de oposição. O contato estabelece-se pelo mimetismo ou contraste afetivos. É assim que se instaura uma primeira forma concreta e pragmática de compreensão, ou melhor, de participacionismo mútuo. O contágio das emoções é um fato comprovado variadíssimas vezes. Depende do seu poder expressivo, no qual se basearam as primeiras cooperações de tipo gregário, e que incessantes permutas e, sem dúvida, ritos coletivos transformaram meios naturais em mímica mais ou menos convencional.” (apud: Almeida, 1999:39)

Wallon fala-nos do contágio das emoções pelo mimetismo, entre sujeitos no mesmo campo de percepção e ação. A partir disso podemos inferir sobre a indução de emoções, nos diversos ambientes e situações, entre os seres relacionais, inclusive nos ambientes telemáticos.

Entendemos que a característica da emoção explicitada por Wallon como contágio emocional, em congruência aos aspectos explicitados por Damásio e Maturana, apresenta subsídios relevantes ao uso da linguagem emocional na educação, especialmente no que se refere à forma de despertar/provocar reações/emoções no outro.

Assim, entendemos que pelo mimetismo emocional as reações de um sujeito da aprendizagem provocam no interlocutor outras reações (respostas) convergentes (na mesma direção), ao passo que pelo contraste emocional a resposta se dará por reações defensivas dos sujeitos relacionais.

Muito temos refletido e estudado sobre a formação de professores. Porém, o aspecto emocional na formação dos educadores não teve e não tem tido a devida valorização e atenção.

Constantemente estudamos e refletimos insistentemente a necessidade de transformação dos professores, mas como nos diz Nóvoa (1992:25) “... a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante ‘investir na pessoa’ e dar um estatuto ao ‘saber da experiência’.”

Ao mesmo tempo, estamos vivendo e pensando a formação de professores no mundo atual e portanto, devemos refletir esse processo na era tecnológica, que tem trazido mudanças profundas nas formas de relações humanas emergentes.

Byington (1996:68/69) assinala que “...a posição corporal e a atitude dos alunos são expressivas e nos auxiliam a identificar o que ocorre em sua psique (...) por isso dizemos que o corpo, como tudo mais, é simbólico e requer o conhecimento e a atenção do professor.”

Nos ambientes telemáticos a observação corporal ainda é restrita/limitada. Por nos utilizarmos, em grande parte dos casos, da comunicação por meio da linguagem escrita, os aspectos corporais observáveis, que envolvem olhar, expressão oral, gestual, tátil, tornam-se inviáveis. Portanto, há necessidade de que os professores nesses ambientes dediquem especial atenção às comunicações escritas expressas pela Linguagem Emocional no processo de interação.

Novamente surgem questionamentos acerca da linguagem utilizada nesses ambientes de aprendizagem. Não estamos tratando de Linguagens de programação, mas sim da linguagem utilizada para a comunicação/ conversação entre os indivíduos. O linguajar que possibilita essa interação entre os seres envolvidos ainda se dá predominantemente pela escrita. Muitos associam esse momento como “a volta da comunicação por cartas”, porém de uma forma muito mais rápida e eficiente.

Sabemos que a interação via computador, mais específicamente, a Internet, não deve ser comparada à interação presencial. São diferentes sim; e não queremos aqui qualificá-las, pois entendemos que não é esse o objetivo desse estudo, porém, devemos fazer algumas reflexões à luz de aspectos significativos:

- precisamos aprender a trabalhar com o “e” e não apenas com o “ou”; ou seja, não precisamos optar, por exemplo entre o presencial “ou” o virtual. Não há substituição de um pelo outro, mesmo porque acreditamos na necessidade de encontros presenciais pontuais, mediando os cursos a distância;

- podemos estabelecer uma relação afetiva, emocional, mesmo a distância. Devemos considerar o uso da linguagem emocional para que essa dinâmica relacional possa de fato abrir espaços de transformações entre os sujeitos envolvidos;

- sendo o professor, o mediador desse processo, há necessidade de uma mediação pedagógica permeada por uma linguagem emocional congruente, para que o fluir das conversações interativas seja consubstanciado de emoções expressas conscientemente, podendo assim abrir canais para e efetivação dos processos reflexivos e críticos, transformando os espaços operacionais e os sujeitos da aprendizagem.

 

3. Considerações Finais

 Não há modelos, receitas ou signos na linguagem emocional. Há sim uma proposta de construção de ambientes de aprendizagem em que se considere e vivencie as emoções, expressas no linguajar das conversações, como mediadoras do processo de construção do conhecimento, facilitando a dinâmica relacional entre os seres, o meio e suas circunstâncias.

Compreendemos que nos ambientes de aprendizagem a linguagem emocional está presente nas conversações estabelecidas por todos os sujeitos em interação. No entanto quero chamar a atenção ao aspecto da intencionalidade no uso da Linguagem Emocional pelo mediador pedagógico, que pode representar um diferencial significativo para o processo de construção do conhecimento, como ficou evidenciado em minhas pesquisas.

Especialmente nos ambientes telemáticos, onde a expressão/ comunicação ocorre pela linguagem escrita, o cuidado com o uso de uma Linguagem Emocional intencional, que possa induzir e/ou desenvolver emoções que convirjam em aproximação, reciprocidade, interação, deve ser melhor considerado.

Nos cursos a distância em ambientes telemáticos, o uso intencional de uma linguagem emocional merece cuidado e atenção. Os cursos em ambientes telemáticos devem considerar a  abordagem do “estar junto virtual”, que pressupõe a criação de um ambiente de aprendizagem interativo, onde a construção do conhecimento seja um ato contínuo e um compromisso assumido por todos os sujeitos aprendentes.

A partir dessa concepção, o cuidado e atenção com a Linguagem Emocional dos mediadores pedagógicos deve ser um ponto importante a ser observado e desenvolvido. O uso intencional de uma Linguagem Emocional que possa provocar, instigar, “induzir”, contagiar todos os participantes a movimentos de aproximação recursiva, na busca contínua de “quebrar couraças” que bloqueiam muitas vezes a exposição de emoções, se faz necessário e pode auxiliar no processo de construção do conhecimento.

Os ambientes telemáticos permitem o “disfarce” de emoções e sentimentos, uma vez que o uso da linguagem escrita possibilita-nos “filtrar”, camuflar, o que queremos ou não expressar.  

Os estudos desenvolvidos neste trabalho indicaram que a mediação pedagógica nesses ambientes de aprendizagem, deve privilegiar as interações recorrentes entre todos os envolvidos, buscando na linguagem emocional sustentação para que os campos operacionais se abram em canais explicitos de comunicação intersubjetivas.

Desse modo, a linguagem emocional utilizada pelo mediador pedagógico pode abrir espaço para que emoções e sentimentos sejam desvelados, criando então um espaço operacional mais coeso, mais hamônico e propício às inter-relações emergentes, e consequentemente, possibilitando construções e reflexões mais complexas.

Esta proposta contribui para a construção de ambientes de aprendizagem onde os sujeitos aprendentes sitam-se mais seguros a expressar seus sentimentos e emoções, e aprofundem suas reflexões. O uso de uma Linguagem Emocional congruente pode instigar trocas mais efetivas entre os envolvidos, propiciando a construção de ambientes colaborativos de aprendizagem e quem sabe, comunidades de aprendizagem.

Somos seres racionais e emocionais. A aceitação e compreensão desse fato só trará benefícios a todos nós. Trabalhar a formação de educadores partindo desse novo olhar, é respeitá-lo por inteiro, é percebê-lo como sujeito, também aprendente, que precisa, assim como seus alunos, experenciar, vivenciar e expressar suas emoções. É buscar a coerência entre a teoria e a prática no saber fazer, saber conhecer, mas fundamentalmente, no saber ser integralmente.

 

“...Viver é afinar o instrumento

De dentro prá fora, de fora prá dentro

A toda hora, a todo o momento

De dentro prá fora, De fora prá dentro...”

Walter Franco (1991)

 

Notas

[1] “Autopoiese é uma palavra composta das palavras gregas ‘para si mesmo’ e ‘produzir’” (Maturana, 1997:133). Maturana e Varela desenvolveram conceitos sobre sitemas autopoiéticos e organizações autopoiéticas. Para maiores detalhes ver as obras desses dois autores.

2- Nem todas as referências telemáticas estão disponibilizadas no ambiente (Internet) com data e página.

3 Para mais detalhes ver Revista Educação. Ano 27 – nº 240 – Ed. Segmento, abril/2001, p. 40-51

 


Referências Bibliográficas

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